A construção civil é o reino da informalidade, especialmente a construção de imóveis residenciais unifamiliares e reformas, realizadas por profissionais autônomos ou até mesmo por empresas construtoras que não formalizam o emprego ou contrato de trabalho autônomo, até mesmo pela imensa rotatividade dos trabalhadores.
Da maximização da arrecadação.
O INSS deixou de fiscalizar o recolhimento das contribuições previdenciárias em obras, pois tem sido vantajoso para a autarquia efetuar a cobrança posteriormente à conclusão do trabalho, através do §4º do Art. 33 da Lei nº 8.212/91, que dispõe:
§ 4º Na falta de prova regular e formalizada pelo sujeito passivo, o montante dos salários pagos pela execução de obra de construção civil pode ser obtido mediante cálculo da mão de obra empregada, proporcional à área construída, de acordo com critérios estabelecidos pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, cabendo ao proprietário, dono da obra, condômino da unidade imobiliária ou empresa corresponsável o ônus da prova em contrário. (Redação dada pela Lei nº 11.941, de 2009).
A vantagem do INSS em recolher desta forma é onde reside a injustiça com os trabalhadores da construção civil. Dessa forma ficam alijados de todos os direitos previdenciários, pois não é exigido ao proprietário, dono da obra, condômino da unidade imobiliária ou empresa responsável que informe e que a referida contribuição ingresse aos cofres da previdência social sem referência alguma aos trabalhadores que se envolveram na obra.
Consequentemente, o INSS vem há mais de 20 anos arrecadando bilhões de reais do setor da construção civil, e deixando de pagar direitos previdenciários aos trabalhadores desse setor, que correspondem a outros bilhões de reais.
Apesar do INSS exigir que todos os Municípios forneçam mensalmente relação de alvarás para obras de construção civil, conforme art. 50, Lei nº 8.212/91, em geral, quando existe fiscalização, se focam nos prédios e empreendimentos comerciais maiores, com envolvimento de mais trabalhadores. A Fiscalização do Trabalho é mais eficiente nessa área, exigindo que os contratos sejam formalizados, aplicando multas pesadas aos proprietários ou responsáveis.
A arrecadação previdenciária, hoje realizada pela Receita Federal, com as informações prestadas pelos municípios, tem condições de realizar a cobrança das contribuições previdenciárias, e se o contribuinte não o fizer, a SRF incluirá a dívida em procedimentos de ação fiscal, com multa imediata de 75% do valor devido (01).
Portanto, o governo “ganha” de ambos os lados, já que a tendência é, ao proprietário desavisado, que está construindo sua primeira (e talvez única casa na vida) não se atentar pelas formalidades e exigências legais e ter que pagar praticamente o dobro (ou 175% do valor do imposto), e o INSS deixando de pagar os correspondentes benefícios previdenciários.
Da responsabilidade do recolhimento pela empresa tomadora da prestação de serviço.
Todo advogado previdenciário já se deparou com uma situação de desespero de um trabalhador da construção civil ou sua família, pois raramente esses trabalhadores têm planejamento financeiro ou se preocupam com o futuro. Entretanto, são uma categoria das mais expostas a acidentes de trabalho e doenças ocupacionais que causam não apenas incapacidade laboral, mas também e não raramente o óbito.
Ocorre que pouco explorada a alteração da Lei nº 10.666/2003, que determina que a responsabilidade do recolhimento dos trabalhadores autônomos que prestam serviço à pessoa jurídica não é mais pessoal, mas sim da empresa tomadora do serviço, como segue:
Art. 4º Fica a empresa obrigada a arrecadar a contribuição do segurado contribuinte individual a seu serviço, descontando-a da respectiva remuneração, e a recolher o valor arrecadado juntamente com a contribuição a seu cargo até o dia 20 (vinte) do mês seguinte ao da competência, ou até o dia útil imediatamente anterior se não houver expediente bancário naquele dia.
Do direito aos benefícios previdenciários.
Isto posto, é bem sabido que quando a responsabilidade é de terceiro e não do trabalhador, presume-se recolhida a contribuição previdenciária para todos os fins.
Assim, não há o que se falar que o trabalhador da construção civil não teve a retenção e por isso não terá o direito ao benefício. Terá sim. E não apenas terá direito ao benefício como o valor recebido a título de prestação do serviço deve ser o valor a ingressar no período básico de cálculo do benefício.
Existem decisões do TRF da 4ª Região neste sentido:
“PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE SEGURADO. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. PRESTADOR DE SERVIÇOS. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. ÔNUS DA EMPRESA. AÇÃO PROCEDENTE. TUTELA ESPECÍFICA.
1. O contribuinte individual é segurado obrigatório da Previdência Social, e como tal, a sua filiação decorre automaticamente do exercício de atividade remunerada. Assim, o marido da autora estava filiado à Previdência Social ao tempo do óbito, porquanto exerceu a atividade de motorista autônomo, conforme as provas carreadas aos autos.
2. Em se tratando de contribuinte individual, que presta serviço de natureza urbana, o ônus quanto ao recolhimento das contribuições previdenciárias é da empresa contratante, nos termos do art. 4º da Lei 10.666/03.
3. Na vigência da Lei nº 8.213/91, dois são os requisitos para a concessão de benefício de pensão por morte, quais sejam, a qualidade de segurado do instituidor e a dependência dos beneficiários que, se preenchidos, ensejam o seu deferimento.
4. Sentença reformada, para condenar o INSS a conceder à parte autora o benefício de pensão por morte desde a data do requerimento administrativo.
5. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).” (TRF4, AC 2006.71.18.001782-8, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 25/07/2008).
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE SEGURADO DO “DE CUJUS”. CONTRIBUINTEINDIVIDUAL. PRESTADOR DE SERVIÇOS. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. ÔNUS DA EMPRESA. CONSECTÁRIOS. IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva a pensão.
2. O contribuinte individual é segurado obrigatório da Previdência Social, e como tal, a sua filiação decorre automaticamente do exercício de atividade remunerada. Assim, o marido da autora estava filiado à Previdência Social ao tempo do óbito, porquanto fora contratado por empreitada, como autônomo.
3. Em se tratando de contribuinte individual, que presta serviço de natureza urbana ou rural, o ônus quanto ao recolhimento das contribuições previdenciárias é da empresa contratante, nos termos do art. 4º da Lei 10.666/03. (…)
Precedente da 3a Seção desta Corte (QUOAC 2002.71.00.050349-7, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 01/10/2007).
Nos casos de pensão por morte acidentária ou benefício por incapacidade acidentária a comprovação de que o contribuinte individual estaria prestando serviço para a empresa tomadora é mais simples. No acidente acaba sendo gerado um boletim de atendimento dos serviços de saúde, ficha hospitalar, posterior internação se for o caso, além de boletim de ocorrência e outros documentos.
Entretanto, há que se ressaltar ainda que a presunção do recolhimento pelo tomador de serviço inclui também a presunção de que as contribuições foram vertidas em dia, portanto, computáveis para carência.
Dessa forma, o contribuinte individual deverá comprovar o exercício da atividade por doze meses (ou quatro meses se for caso de reingresso ao RGPS) para ter direito a gozar de benefício por incapacidade. Dessa forma, igualmente ao empregado que perdeu a CTPS, ou ao segurado especial, ou o doméstico que não teve seus recolhimentos vertidos pelo empregador, o contribuinte individual deverá comprovar apenas o exercício de atividade remunerada sem vínculo de emprego para obter o direito ao benefício.
E da mesma forma, contando o contribuinte individual com contribuições formais até 03/2003 e que depois dessa competência parou de recolher, se comprovar que laborou para empresa tomadora dos seus serviços durante vários anos e, somando com o período que já possuía, completar a carência, terá direito a aposentadoria por idade, mesmo sem constar nenhuma contribuição no CNIS após 04/2003.
Nada obsta também que esta categoria de trabalhador venha a obter direito a aposentadoria por tempo de contribuição ou até mesmo a aposentadoria especial, computando esse período após 04/2003, na forma como anteriormente exposto.
Por fim, não cabe o INSS falar que nos casos de comprovação da atividade pelos profissionais da construção civil sem que os mesmos apresentem contribuições vertidas em seu próprio nome seja concessão de benefícios sem a correspondente contra prestação. Na realidade, o setor da construção civil é onde o INSS arrecada mais pagando menos, e sobre a mão de obra desses trabalhadores a previdência social já faturou bilhões sem conceder os benefícios devidos, fato que se espera tenha fim mais brevemente possível.
Obs.: Caso haja pagamento espontâneo a vista, é concedida uma redução de 50% no valor da multa, e se houver parcelamento, há uma redução de 40%
Elaborado por Eduardo Koetz – extraído do site http://www.fiscosoft.com.br em 18/09/2013