O Judiciário pode redimensionar multas impostas aos contribuintes, na hipótese de violação do princípio do não-confisco, contido no artigo 150, inciso IV, da Constituição Federal. Com base nesse dispositivo e também respaldada por jurisprudência pacificada nas cortes superiores, a 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul manteve sentença que anulou multa de 500% aplicada sobre um contribuinte pessoa jurídica do município de Montenegro.
Nos dois graus de jurisdição, houve consenso de que uma multa nesse patamar também desrespeita os princípios da razoabilidade e da proprocionalidade, sendo correta a sua redução para 100%, como determinou a juíza Deise Fabiana Lange Vicente, titular da 2ª Vara Cível da Comarca de Montenegro. Ao proferir a sentença, ela considerou o percentual fixado ‘‘abusivo, excessivo e confiscatório’’.
Embora admita que a Constituição só refere o princípio do não-confisco aos tributos, a juíza disse, no entanto, que não se pode permitir que as sanções sejam excessivamente ou abusivamente fixadas pela Fazenda Pública Municipal. Ela lembrou que o Supremo Tribunal Federal já se pronunciou no sentido de que ‘‘tem natureza confiscatória a multa fiscal superior a duas vezes o valor do débito tributário’’.
‘‘Por conseguinte, tem-se entendido que a proibição constitucional de utilização de tributo com efeito de confisco abrange também a multa, a qual é acessório do tributo e é cobrada da mesma forma que o crédito tributário. Nesse aspecto, a multa fixada em 500% tem, de fato, caráter confiscatório’’, reforçou.
O relator da Apelação no TJ-RS, desembargador João Barcelos de Souza Júnior, afirmou que a redução do percentual da multa, decidida pela juíza, é razoável. Principalmente se levado em conta que o disposto no artigo 59, parágrafo 8º, da Lei 4.010/2003 — que estabelece o Código Tributário do município — foi modificado pela Lei Complementar 5.520/2011, reduzindo o percentual de multa para 100%. O acórdão foi lavrado na sessão do dia 10 de abril.
O caso
O município de Montenegro lançou um auto-de-infração contra a parte autora, datado de 2 de junho de 2011, pelo não-recolhimento correto do Imposto Sobre Serviços (ISS). Como penalidade, o fisco local arbitrou multa pecuniária de 500% sobre o valor que entende devido.
A empresa, voltada à prestação de serviços no ramo eletrotécnico, ajuizou Ação Ordinária de Anulação de Multa Fiscal por considerar inconstitucional o dispositivo legal que a fundamenta — o artigo 59, parágrafo 8º, da Lei Complementar 4.010/2003.
Citado, o município se defendeu. Alegou que agiu dentro do princípio da legalidade, pois o Código Tributário Municipal prevê o percentual da multa a ser aplicada. Disse que a parte autora não comprovou que o percentual aplicado possui o caráter de confisco. E mais: segundo o município, o texto constitucional se refere a tributo, e não à multa, que possui o caráter de sanção, e esta inibe a prática da sonegação fiscal.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 1º de maio de 2013