Versa a presente notícia a respeito da decisão do STJ sobre a responsabilização civil pré-contratual da empresa, por ato de ex-presidente, que frustrou a celebração de contrato de concessão mercantil.
Ementa: RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 535 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. AUSÊNCIA. DECLARATÓRIOS PROCRASTINATÓRIOS. MULTA. CABIMENTO. CONTRATO. FASE DE TRATATIVAS. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ. DANOS MATERIAIS. SÚMULA Nº 7/STJ.
1. Não há falar em negativa de prestação jurisdicional se o tribunal de origem motiva adequadamente sua decisão, solucionando a controvérsia com a aplicação do direito que entende cabível à hipótese, apenas não no sentido pretendido pela parte.
2. “No caso, não se pode afastar a aplicação da multa do art. 538 do CPC, pois, considerando-se que a pretensão de rediscussão da lide pela via dos embargos declaratórios, sem a demonstração de quaisquer dos vícios de sua norma de regência, é sabidamente inadequada, o que os torna protelatórios, a merecerem a multa prevista no artigo 538, parágrafo único, do CPC (EDcl no AgRg no Ag 1.115.325/RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, DJe 4/11/2011).
3. A responsabilidade pré-contratual não decorre do fato de a tratativa ter sido rompida e o contrato não ter sido concluído, mas do fato de uma das partes ter gerado à outra, além da expectativa legítima de que o contrato seria concluído, efetivo prejuízo material.
4. As instâncias de origem, soberanas na análise das circunstâncias fáticas da causa, reconheceram que houve o consentimento prévio mútuo, a afronta à boa-fé objetiva com o rompimento ilegítimo das tratativas, o prejuízo e a relação de causalidade entre a ruptura das tratativas e o dano sofrido. A desconstituição do acórdão, como pretendido pela recorrente, ensejaria incursão no acervo fático da causa, o que, como consabido, é vedado nesta instância especial (Súmula nº 7/STJ).
5. Recurso especial não provido. (REsp 1051065/AM, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/02/2013, DJe 27/02/2013)
Sob a relatoria do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento a recurso de montadora, no qual buscava se eximir do pagamento de indenização por atos praticados pelo ex-presidente montadora no país.
A montadora foi condenada em ação indenizatória por danos materiais, proposta por empresa candidata à celebração de contrato de concessão comercial, devido à injustificada ruptura de tratativas para instalação de uma concessionária em Manaus.
Para os ministros, diante das peculiaridades do caso, a montadora incorreu em responsabilidade pré-contratual, pois, além de frustrar a legítima expectativa de que o negócio seria concluído, gerou expressivo prejuízo material à outra parte.
Na origem, a montadora publicou anúncio convocando novos parceiros para ampliar a rede de revendedores autorizados, ocasião em que a candidata deu início ao processo de negociação com o presidente da montadora para abertura de uma concessionária.
Houve diversas reuniões entre o presidente da montadora e a candidata para discutir a viabilidade do negócio. Depois de apresentar todos os documentos solicitados, a candidata foi informada de que o processo de contratação havia sido positivamente concluído e que, logo, haveria reunião para assinatura do contrato.
Nesse ínterim, a candidata foi procurada por empresa de consultoria, indicada pela montadora, que comunicou oficialmente a finalização do processo de candidatura, solicitando depósito de numerário (R$ 75 mil) em conta corrente para a conclusão da etapa, porém, logo após, a candidata foi informada sobre o cancelamento do processo de contratação.
Posteriormente, houve divulgação na mídia de que todo o processo não passou de golpe que o então presidente da montadora, extrapolando os limites de suas atribuições, estava praticando em todo o território nacional. Depois de descoberta a fraude, a montadora tentou se isentar do pagamento da responsabilidade pelos valores pagos pela candidata, motivando-a a propor a ação indenizatória.
Em primeira instância, o pedido foi julgado procedente, condenando a montadora ao pagamento de indenização por danos materiais e morais. Em segunda instância, o Tribunal excluiu a condenação de indenização por danos morais.
A montadora recorreu ao STJ sob o argumento de não haveria nada ilegal na exigência do pagamento preliminar de R$ 75 mil, nem no fato de as negociações não terem evoluído. Argumentou que não estariam configurados os requisitos da responsabilidade civil extracontratual e que haveria enriquecimento ilícito da candidata, uma vez que as negociações preliminares não teriam caráter vinculante.
No STJ, o ministro relator considerou que a afirmação da montadora de sua intenção em contratar, adiantando os documentos exigidos para a formalização do contrato definitivo, trocando correspondências, informando a aprovação da adesão aliada ao depósito prévio, deu origem à responsabilidade pré-negocial.
Conforme a doutrina e precedentes do STJ, incorre em responsabilidade pré-negocial a parte que cria na outra a convicção razoável de que o contrato será assinado, mas rompe as negociações, ferindo legítimos direitos de quem agiu com boa-fé.
No caso, o relator entendeu que a responsabilidade pré-contratual discutida não decorre do fato de a tratativa ter sido rompida e o contrato não ter sido concluído, mas, sim, de uma das partes ter causado à outra, além da expectativa legítima de que o contrato seria concluído, efetivo prejuízo material.
Em nossa acepção, a decisão do STJ se mostra adequada e condizente com a cláusula geral da boa-fé objetiva, positivada em nosso ordenamento jurídico por meio do artigo 422 do Código Civil. Com efeito, mesmo que o contrato não tenha sido efetivamente celebrado, não se pode esquecer que as partes devem observar a boa-fé nas tratativas preliminares, as quais devem ser conduzidas de maneira transparente de maneira a permitir a celebração de um contrato equilibrado.
E quando a parte deixa de observar este preceito na fase das negociações, o que também é caracterizado quando simplesmente ignora todo o avençado, deixando de celebrar o contrato, pratica ato ilícito que permite à parte que teve sua legítima expectativa injustificadamente frustrada buscar a devida e pertinente reparação.
Fonte: Site Decisoes.co.br – Renato Nunes. Advogado: Bacharel em Direito pela Universidade Paulista (UNIP), 1998, Doutorando em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP); Mestre em Direito Tributário pela PUC/SP, 2005; Especializado em Direito Tributário pela PUC/SP, 2000. Membro do Centro Internacional de Estudos Tributários – CIEST – e do Instituto de Pesquisas Tributárias – IPT.